O Homem conduz mas a mulher não é uma marionete

domingo, 12 de agosto de 2007

O homem conduz mas a mulher não é uma marionete

Existem idéias sobre o tango que, às vezes, sem serem explicitas, tem conseqüências sobre a forma em que se dança o tango. Como no tango o homem é quem toma a seu cargo a condução da dança (direção, figuras, etc.) se tende a ver isto de forma mecânica. Determinada marca é um estímulo que forma parte de um arco refletido, é dizer: tal estímulo produz determinada resposta automática. Efetivamente, a marca do homem condiciona o que faz a mulher. É lei no tango que o homem conduza isto, no entanto, não quer dizer que a mulher seja uma marionete, pois se apagaria a produção conjunta do baile e sobre toda a emoção que tem nela. Se um é guiado por este mecanismo (ainda que seja sem se dar conta) na forma de considerar a marca do homem e a resposta a ela se pode registrar várias conseqüências. Pode-se notar nos começos da aprendizagem, tanto no homem como na mulher que, efetivamente, muitos se formam nesta idéia da condução. Vemos então que os homens realizam marcas mecânicas e desarticuladas e as mulheres respondem de forma imediata ou em forma resistida, mas sem considerar o que elas podem fazer nessa resposta. Tende-se a recortar muito esquematicamente os sinais das marcas. A mão que marca na espádua e os braços parecem desarticulados do resto do corpo. Separa-se a marca de toda a intenção corporal de até aonde quer ir o homem ou que figura quer fazer. Isto tem conseqüências negativas sobre a forma de marcar e conduzir. Exageram a marca mais do que o conveniente, como se o movimento de uma mão devesse ser muito notório para obter a resposta desejada. Na mulher é possível observar isto no que o passo CAI, como se a mulher não tomasse para si o tempo ou a intenção, e como se não pudesse sustentar seu corpo a margem do homem ou como se o passo ela não o fizesse. Quiçá seria conveniente transformar a idéia de esquema estímulo-resposta por uma engrenagem, aonde a ação do homem (todo seu corpo, sua sensibilidade e sua intenção) conduz a que a mulher também produza ações (com todo seu corpo, sua sensibilidade e sua intenção) que por sua vez encadeiam nas ações do homem e assim sucessivamente, sendo muito difícil separar absolutamente a ação de um da do outro.
Interessa-me referir-me à parte do dançar da mulher, pois ainda que sempre se diga que é muito mais simples que a do homem (e isto é certo) sem dúvida deve empreender uma árdua tarefa. Deve por um lado afinar sua sensibilidade para reconhecer a intenção do homem e, ao mesmo tempo, responder com sua segurança, sua consistência nos passos e seu tempo de dança. Um delicado equilíbrio que articula sua necessária e sutil disponibilidade a responder à condução do homem e sua firmeza, segurança e destreza na dança.
Então, ainda que o trabalho de converter-se em uma boa bailarina implique uma tarefa menos complexa que a do homem, não deve descuidar-se a dificuldade que supõe a delicada tarefa de articular sua disponibilidade à condução do homem com a firmeza de sua dança. E isto pode apresentar problemas, agravam-se alguns desses termos.
Se agravar-se a disponibilidade pode chegar a responder automaticamente à marca. Freqüentemente a mulher, em seus inícios, responde automaticamente. O passo se faz breve, pouco consistente, como se caísse. O efeito é que a mulher é arrastada, repreendida e até perde o equilíbrio. É um “pudim” que não baila, senão que é bailado. Ela responde automaticamente à marca e não dá a ela seu volume, sua distância e seu estilo aos passos.
Se ela inclina a balança do lado da firmeza talvez não possa bailar em companhia e sensivelmente. Ao se subtrair à entrega ao baile e ao que a conduz, talvez pareça que baila só, como soslaiando a engrenagem da qual faz parte. Na engrenagem as duas peças devem se ajustar, coincidir, se encontrar, dialogar, ao fim das contas não é uma maquinaria (ainda que às vezes o pareça) senão um diálogo de sensibilidades.
Uma das características do dançar da mulher está em seus adornos, mas, sobre tudo, em sua maestria para saber seguir ao homem e bailar com seu estilo.
Quando uma boa bailarina responde muito bem à marca, pode dançar com cada homem impondo seu próprio estilo e ao mesmo tempo em correspondência com o estilo de dançar do homem. Isto pode parecer aos olhos dos demais como que a mulher já saiba o que vai fazer o homem. A marca ou a condução masculina não se nota. Parece que já soubesse o que é que vai fazer. Sua resposta é imediata, mas muito consistente. Não se nota que está deixando se levar e que é absolutamente sensível e disposta condução masculina. Adverte-se sua presença por seu estilo, porque torna fácil essa dificuldade de entender e perceber a marca do homem e logra incluir seu estilo, suas figuras, seus adornos, seu bailar.
Artigo publicado na Revista B.A.Tango, Ano IV, Número 89, dezembro de 1998, Buenos Aires


Tradução de Regina Santana

About Author

Deixe um comentário